Ok, então foi assim:
Ontem, mesmo depois de terminar de escrever o post sobre a saudade, levantei-me e dirigi-me à Faculdade de Arquitectura de Siracusa. Porquê? perguntam vocês. Porque a minha paranóia foi longe demais e eu até conferências de arquitectura assisto, respondo eu!! Compreensível, dizem vocês com ar duvidoso. Mas não, esta não era uma conferência qualquer. Era uma conferência dada pelos famosos arquitectos Aires de Mateus... tcham, tcham, tcham, tcham... portugueses!!! Ahhhhh, assim está bem, ainda mais compreensível, dizem vocês.
E prontos... lá fui eu, como boa portuguesinha assistir. Até porque é mais ou menos raro nesta piccola cidade do sul da Itália assistir a algo de qualidade seja científica ou cultural internacional.
O auditório estava cheio. Só havia lugares na primeira fila. Glup! Ok. Que seja. Venga. Primeira fila aqui vou eu.
Entre dúvidas sobre como iriam falar, ou seja em que língua, e apresentar os projectos, tal e qual, entram ainda mais pessoas, professores, alunos de outras faculdades, espanhóis (seriam erasmus, penso eu), bla blá, pardais ao ninho.... começa a conferência... o auditório cheio a transbordar pelas costuras....
Devo confessar que fiquei realmente impressionada. Projectos muito bonitos de casas, hotéis e até ganharam o concurso para a reabilitação do Parque Mayer em Lisboa, com uma proposta muito interessante. A apresentação foi toda em italiano. Macarrónico, mas italiano. Ao que parece não era a primeira vez que vinham a Siracusa e até têm por aqui alguns amigos entre os professores.
Mas ok. A questão é esta: depois de escrever aquele post ontem, eu estava, a modos que um pouco sensível e a verdade é que, de uma forma completamente espontânea e inusitada fiquei orgulhosa e contente de ver o que vi. E estava mesmo a pensar nisto quando o arquitecto termina de falar, um professor agradece, diz que estamos todos em família e de uma forma muito informal convida rapidamente os presentes a colocar questões....
Eu, amante da discrição, do reservado e do passar despercebido (ainda que tenha umas gargalhadas bastante sonoras), eu, timidamente, sem pensar e com uma motivação vinda do mais profundo do meu ser, e quase sem querer, levanto o braço........ ah vem até aqui a cima, não, não, não é preciso, vá lá que se ouve melhor, não, não é mesmo preciso obrigada, ao menos levanta-te, ok.... e levanto-me.... o meu coração explodia... tum, tum, tum... acho que até se ouviu no fundo da sala... a cara estava mais vermelha que o meu casaco vermelho.... na boca esboçava um sorriso de palerma que era mais de nervoso que de simpatia, quase a antever o desastre que se seguiria... (era tanto o nervoso que ainda hoje, horas depois do sucedido e enquanto escrevo sinto que me tremem as mãos).... faz-se silêncio... e eu digo, muito timidamente, em frente aquela gente toda, em italiano:
- não sou arquitecta!
(o quê??? não és arquitecta??? pensavam todos e o fra que me olhava de soslaio pensando mas o que é que lhe deu)
- mas sou portuguesa!
(ahhhhhhhhhhh!! risadas e tal...)
- e queria só dizer que me sinto orgulhosa e contente de ver dois arquitectos portugueses que vêm aqui e mostram, em italiano, as coisas bonitas que se fazem no meu país!
TOING!!! O-H M-Y G-O-D!! e ainda acrescentei, como se não bastasse mas um pouco para justificar a figura de merda que tinha acabado de fazer:
- e sei que pode parecer estupidez, mas visto que estamos em família, apeteceu-me dizê-lo....
TOING! TOING! TONI TOTAL!! estavamos em família de arquitectos, não de patriotas bacocos que não sabem controlar as suas emoções e que em momento de guerra mundial, eleições, asae's, licenciados que não encontram emprego, função pública em revolta, etc. vem não sei de onde (da província, de certeza), dizer que até gosta de Portugal e que tem orgulho do que se faz no país!!!!!!!! Então porque é que emigraste?!?!??!??!
E sentei-me e fiquei imóvel para tentar evitar que alguém me visse (impossível dos impossíveis) principalmente o arquitecto mesmo à minha frente, procurando um buraco que não apareceu e que me constringiu a esperar mais duas horas, na primeira fila, com um rubor na cara que não desapareceu, a maldizer tudo e todos e principalmente a minha estupidez impaciente e impulsiva que me fez, em 20 segundos (porque não foi mais do que isto), fazer uma figura deste tipo... impossível descrever o que senti e o que pensei naquele espaço de tempo mas garanto que tudo me passou pela cabeça: desde escavar o tal buraco a voar dali para fora.
O Fra diz que todos aplaudiram (porque ele começou) mas eu nem consegui ouvir nada....