sem sentido
Nunca paro de aprender. De facto, quando tirei o curso de engª do ambiente, nunca pensei que um dia iria passar três semanas seguidas num hospital a realizar testes de dispersão eléctrica aos equipamentos médicos. Mas tudo ok. Não me importo. É diferente, é algo novo e eu sempre gostei deste monta, desmonta, cabo para aqui e para lá, caixa de ferramentas, etc. E depois, é melhor do que estar sentada em frente a um computador todo o dia. Tenho aprendido bastante de electrónica. O objectivo não é nenhum em concreto, somente o facto de que a empresa onde comecei a trabalhar realiza este serviço e como somos poucos temos de saber um pouco de tudo.
Nos primeiros dias passei por departamentos "light" mas estamos a chegar ao fim e hoje estive o dia todo enfiada na unidade de cuidados intensivos para recém nascidos e na unidade de reanimação. Foi um dia silencioso mas atribulado. Se calhar porque, para além de ter aprendido um pouco mais sobre monitores, bombas de infusão e electrocardiogramas, aprendi ainda mais sobre estar calada quando me dói a barriga ou a cabeça. É banal, naif e o que quiserem mas enquanto eu via aqueles bébés minúsculos metidos nas incubadoras e mais tarde, aquelas pessoas todas intubadas, imóveis, entre a vida e a morte, ligadas a máquinas enquanto eu fazia os testes ao lado da cama delas, pensei em porque é que eu estou aqui e eles ali? Porque é que não lhes posso pegar, abraçar ou dizer ao ouvido que lá fora estava um sol maravilhoso, que o verão está à porta e o mar à espera deles? Não consegui olhar para nada e para ninguém. Durante todo o dia estive com os olhos fixados no chão e na máquina, em silêncio para não disturbar e com medo de desligar algo que não devia, metida dentro daquele fato verde que me fez suar em bica, mas não deixei de pensar. Pensei em mil coisas, em mil pessoas, que o meu corpo é uma máquina e se amanhã se avaria é assim mesmo, na minha amiga que descobriu que está grávida, na outra que teve o bébé há dias e na outra que o vai ter dentro de poucas semanas, um milagre depois do outro, na minha sorte, na minha família, nos meus amigos, na turista americana a quem dei boleia de manhã e que me ficou muito agradecida (mas ainda mais espantada por eu ter reparado nela) porque estava há meia hora a torrar ao sol à espera do autocarro, se aquelas pessoas ali deitadas não gostariam de ouvir uma história ou uma canção em vez de um bip, bip contínuo... uffa...
Amanhã tenho de voltar porque são os departamentos com mais equipamentos eléctricos de todo o hospital e não conseguimos terminar tudo hoje...
Enfim, peço desculpa a todos os que passam por aqui (para além da minha família) porque hoje o post não tem nada a ver com nada, nada tem a ver com nada...
Penso agora que, provavelmente, o blog em si não faz sentido nenhum. Isto porque alguém com mais veia poética ou literária (as dos blogs sérios), hoje, por exemplo, teria escrito coisas mais interessantes, profundas e sobretudo mais dignas de serem públicas... eu não consigo exprimir o que sinto hoje... é muito complicado... sinto que tudo é um lugar comum... acho que vou dar um passeio junto ao mar em vez de estar aqui em frente ao computador.. ou limitar-me ao meu caderno de linhas...
2 Comentários:
Desculpa lá Ritonas, mas eu estou completamente em desacordo contigo.
Acho que o que escreveste hoje tem muito sentido e tem muito a ver com tudo e com todos.
Nós é que andamos completamente abstraidos de todas essas coisas, que essas sim, é que são problemas e só nos lembramos delas quando nos tocam à porta.
De vez em quando, precisávamos de estar no lugar onde estiveste, ou noutros semelhantes, a observar, claro,( porque não desejo que ninguem esteja num lugar deses numa outra situação)para acordarmos e darmos valor à n/vidinha de que tantas vezes nos queixamos, e que comparada com a das pessoas que infelizmente estão nesses lugares é uma maravilha.Só pelo facto de termos saúde já devíamos estar muito agradecidos.
Só com estes abanões é que aprendemos a dar valor a certas coisas simples da n/vida.
Claro que este é um tema não muito agradável de se falar, mas de vez em quando é preciso olharmos um pouco mais à n/volta.
Quando lá voltares, não ponhas os olhos no chão,
porque assim ignoras quem está ao teu lado.Sorri para as pessoas e dá-lhes, nem que seja só um olá.
Vais ver como te sentes melhor.E depois só te resta
agradecer por estares nesse papel e por seres uma pessoa maravilhosa que consegue ser sensivel a um problema como este.
Sinto-me orgulhosa.
Mummy
quando é que o verdadeiro sentimento, o da vida, não tem sentido? este tem muito mais que muitos blogs a sério... pois representa a vida
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